terça-feira, outubro 23

"Viseu"

Chegamos a Viseu... bonita cidade beirã que abriga na sua zona histórica- junto à Sé e ao Museu Grão Vasco - um dos mais merecidamente acarinhados restaurantes de cozinha tradicional portuguesa, que dá pelo nome "O Cortiço". Desde há alguns anos a esta parte, esta é uma paragem obrigatória para nós!

O emblemático restaurante viseense nasceu por volta de 1966, em resultado da paixão e sabedoria culinária do lendário Dom Zeferino, sogro do actual proprietário - Serafim Campos. Com uma actividade original que nada tinha que ver com a restauração, Serafim Campos tomou as rédeas do histórico restaurante de Viseu, que dirige com mestria mantendo-se fiel às raízes e à tradição que Dom Zeferino conseguiu recuperar percurendo o país para ir buscar às aldeias o que se estava a perder em termos de tradição culinária. O papel decisivo que este senhor desempenhou na pesquisa e divulgação da cozinha caseira da região, valeu-lhe uma agraciação simbólica por um grupo de vinte ilustres concidadãos de diversas áreas, numa cerimónia levada a cabo no próprio Cortiço e a partir da qual Zeferino passou a ser conhecido por Mestre Dom Zeferino.


Lá fomos nós, subimos a calçada da Rua Augusto Hilário e entramos... De facto a satisfação encontra-se patente nos inúmeros comentários manuscritos que foram literalmente pendurados nas acolhedoras paredes de pedra, que já faz parte do carisma local.

Enquanto consultavamos a ementa do restaurante, deixamo-nos tentar pela excelente broa de milho e pelo característico pão de centeio, que prontamente se fazem acompanhar por um prato de queijo do pastor e por um presunto divinal, ainda uma frigideira de morcela e chouriça!

Como tivemos oportunidade de constatar, estes caseiros pitéus ostentam designações assaz curiosas que evocam, de uma forma ou de outra, a origem das receitas... Optamos por Bacalhau Podre, Apodrecido na Adega - significando esta designação que o bacalhau é pré-frito e marinado, donde resulta um delicioso sabor inesquecível... e um suculento Cabrito Assado no Forno à Pastor da Serra. Para acompanhar este delicioso manjar dos deuses, um vinho da casa, que desempenhou o seu papel na perfeição!

Como ainda nos sobrou um cantinho para algo doce... umas Pêras em Vinho Tinto deliciosamente aromatizadas com canela.

Que saudades tinhamos deste "Cortiço".




domingo, outubro 21

"Peru recheado com castanhas"


"Quem quer quentes e boas?" pregão popular


O frio aperta, as pessoas apressam-se na ânsia de chegar ao calor do lar... mas o cheiro que se desprende do assador de castanhas é quase magnético...

O aroma característico das castanhas assadas é, de facto um ex-libris da Lisboa Outonal, remetendo-nos para os magustos de S. Martinho devidamente regados com jeropiga! Tempos houve em que a castanha assumia as actuais funções da batata, acompanhando pratos de carne, aves e caça e integrando ainda algumas especialidades doces. Hoje em dia, os purés, guisados e recheios continuam a beneficiar da presença das castanhas, com o fácil recurso ao produto congelado a permitir contornar o problema da sua sazonalidade.


1 peru com miúdos (mais ou menos 4kg); 1,5kg de castanhas; 300gr de toucinho; 100gr de manteiga; 1l de água; 4 cenouras; 2 cebolas; 1 haste de aipo; 1dl de vinho branco; 2dl de caldo de carne; sal e pimenta em grão q.b.


Tempere o peru com o sal e pimenta, moída na altura. Lave as castanhas, faça-lhes um golpe circular a toda a volta e dê-lhes uma fervura em água e sal. Pele-as e leve-as de novo a cozer na água com o toucinho picado. Escorra e recheie o peru com metade das castanhas, esmagadas e o toucinho. Embrulhe o peru recheado numa folha de papel vegetal para cozinha e feche bem. Coloque num tabuleiro untado com manteiga e à volta disponha as cenouras, as cebolas cortadas em rodelas e o aipo. Junte um pouco de água onde cozeu as castanhas e o toucinho e coza em forno quente durante cerca de 1 hora. Retire o papel e leve ao forno mais 20 minutos para dourar. Retire o peru para o prato de serviço. Junte o vinho branco, o caldo de carne e a restante água da cozedura das castanhas ao molho do tabuleiro, coe por um passador e leve a lume forte para reduzir e apurar. Rectifique os temperos. Leve as restantes castanhas ao lume com a manteiga e 2 colheres de sopa do molho preparado e deixe estufar durante 10 minutos em lume brando.

Sirva o peru com as castanhas e o molho e acompanhe com salada.

sexta-feira, outubro 19

"Arroz doce branco alcochetano"

Antigamente o arroz doce branco fazia parte integrante da vida festiva de Alcochete, como prato especial. Era uma presença muito querida em todas as comemorações importantes - baptizados, aniversários, Natal, Páscoa... mas principalmente nos casamentos!
O arroz doce branco estava sempre presente, como não faltava em nenhuma comemoração, daí a gíria alcochetana dizer de uma pessoa quando é frequentemente vista em diversos locais: "É como o pires do arroz doce...". Isto quer dizer que está sempre em todo o lado!
2,500gr de arroz; 2,750gr de açúcar; casca de 2 limões; 250gr de manteiga; 4l de leite; 2,5l de água; sal e paus de canela q.b; canela em pó para enfeitar.


Lava-se muito bem o arroz, escorre-se. Dentro de um tacho põe-se o leite, a àgua, a casca dos limões, a canela em pau, a manteiga e o sal. Vai ao lume e quando ferver deita-se o arroz a cozer, mexendo com uma colher de pau. Deve mexer sempre com o cuidado para que o arroz não se pegue ao fundo do tacho, afrouxando o lume para que o líquido não se entorne. Só depois do "bago" de arroz estar cozido se junta o açúcar e continua-se a mexer, seguindo esta técnica: leva-se a colher para a frente, depois para trás, dando a volta ao tacho junto às paredes deste, e traz-se a colher ao meio. Se a colher ficar "em pé" significa que o arroz está pronto.


Deita-se em pires, pratos e travessas. Deixa-se arrefecer e só depois se enfeita com canela em pó, utilizando as pontas dos dedos para fazer desenhos decorativos. O arroz deve ficar bem seco para se poder partir em fatias - como manda a tradição alcochetana.

*Não leva ovos, por isso é branco!

"Fogaça"

A fogaça é uma espécie de pão adocicado. O seu peso tradicional é de um quilo, mas modernamente as doceiras começaram a fazer a fogaça em miniaturas, com o peso de duzentas e cinquenta gramas ou quinhentas gramas. O seu passado histórico tem mais de 600 anos! Nasceu de uma promessa... em tempos idos, quando os homens se fizeram ao mar, surgiu inesperadamente um vendaval tão forte que até as esperanças se perderam! Nessa altura, um barqueiro, sentindo-se naufragar, gritou pela Virgem Santíssima, pedindo-Lhe protecção. E a fé foi tão grande que a Senhora apareceu, surgindo do monte da Atalaia... e o vendaval amainou permitindo à embarcação chegar com a tripulação, sã e salva, a Alcochete. A fé desses barqueiros consolidou-se e como reconhecimento foram em procissão ao monte da Atalaia oferecer à Virgem (que tomou o nome da localidade) uma bandeira e a miniatura do seu barco. E como nesse tempo já havia gente com muita arte para a doçaria, fizeram uma bola morena e adocicada a que deram o nome de Fogaça.
5 kg de farinha de trigo; 3,5 kg de açúcar amarelo; 125 gr de canela em pó; 1,250 kg de manteiga; 1l de água; 1kg de raspa de limão.

Dentro de um alguidar deita-se a farinha, o açúcar, a raspa dos limões e a canela, mistura-se tudo muito bem. A um canto do alguidar põe-se a manteiga derretida e metade da água por cima da manteiga. Amassa-se ao soco como se fosse a massa do pão e vai-se acrescentando o resto da água. Parte-se a massa em forma de bola com o peso de um quilo, quinhentas gramas ou duzentas e cinquenta gramas, e barram-se com gema de ovo. Fazem-se golpes laterais, de cima para baixo, para decorar. Vai ao forno a cozer.
Nunca utilizar açúcar branco, a cor morena é devida à canela e ao açúcar amarelo que, quanto mais escuro for, melhor!



segunda-feira, outubro 15

"As amêijoas Alcochetanas"

O Largo da República assim denominado por ter sido o local de Alcochete onde se içou, pela primeira vez, a bandeira republicana aquando da implantação da República, em 1910, chamava-se, anteriormente, o Largo da Praça, sendo um espaço público onde os homens de Alcochete se reuniam esperando ser contratados pelos patrões, para o trabalho nas salinas.

A maioria das famílias vivia endividada e a sua alimentação era muito fraca. Quanto às crianças, alimentavam-se geralmente de açorda com alho. Chegadas aos sete anos de idade, iam para o campo munidas de uma navalha para apanhar nabos e comê-los crus! Alguns comiam sopa de feijão que o pai cultivara numa terrinha...


A maioria dos alcochetanos eram salineiros, como tal na sua maioria, tinham três meses de crise. Sem trabalho, quando caíam as chuvas de Inverno.


Nessas ocasiões, alguns iam para a Capital, para a descarga do carvão. Mas nem todos eram seleccionados. Então, estes iam para o mar apanhar amêijoas para as vender pelas ruas.


De canastra à cabeça, apregoavam "Eh! amêijoa... Eh! amêijoa!", e vendiam por cinquenta centavos uma tigela bem cheia, apinhada...

1kg de amêijoas; 2 tomates; 1 pimento; 1 cebola grande; azeite e sal q.b.

Deixa-se refogar a cebola com os tomates, pimento, azeite e sal, dentro de um tacho. Juntam-se algumas amêijoas e sacode-se o tacho (como se fossem castanhas a assar).
Logo que estas amêijoas estejam abertas, acrescentam-se mais e sacode-se novamente o tacho.

E pronto! Modernamente aromatiza-se com um ramo de coentros e pode substituir-se o azeite por banha ou toucinho.

"Massada de Choco Alcochetana"

1kg de choco; meio quilo de massa cotovelo grossa; 1 cebola grande; 2 tomates médios; 1 dente de alho; 1 ramo de coentros; sal, piri-piri e azeite q.b.
Num tacho, refogam-se em azeite, a cebola e o alho bem picadinhos, sal e coentros.
Coze-se à parte o choco. Depois de cozido, parte-se aos bocados e junta-se ao refogado, com um pouco de água da cozedura do choco. Deixa-se levantar fervura e deita-se-lhe a massa de cotovelo e piri-piri (a gosto).
Deixar apurar e servir!